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Mudanças climaticas e direitos humanos

Entrevista realizada por Adriana Cardoso et Yasmin Labidi

Milhares de pessoas deslocadas por causa do clima na Bélgica, Alemanha e França em 2021 e 2022: sim, as mudanças climáticas também nos afetam.
Luxemburgo é um dos países mais ricos do mundo; proporcionalmente, é também um dos maiores emissores de CO2 e, portanto, responsável pelas mudanças climáticas.

Por ocasião do dia 10 de dezembro (Dia Internacional dos Direitos Humanos), conversamos com Antoniya Argirova (ativista de justiça climática do Greenpeace Luxemburgo) sobre as mudanças climáticas e seu impacto nos direitos humanos, com foco nos deslocados climático*.

Transition Minett : Quais direitos humanos são afetados pelas mudanças climáticas?

Antoniya Argirova : Trata-se de uma questão abrangente, que envolve direitos econômicos, sociais e culturais, bem como direitos civis e políticos. Para ilustrar isso, podemos mencionar, por exemplo, a queixa apresentada à Corte Europeia de Direitos Humanos por seis jovens cidadãos portugueses após os intensos incêndios florestais em Portugal em 2017, que forçaram a fuga de moradores locais.  Os jovens cidadãos estão levando 33 países ao tribunal por inação frente às mudanças climáticas. A mudança climática está tendo um impacto sério na vida das pessoas – jovens que não podem continuar seus estudos, pessoas que estão em risco, que estão perdendo suas casas e suas terras, cuja saúde está se deteriorando…

Como podemos ver, a mudança climática também é um catalisador de conflitos armados. Há cada vez mais conflitos por causa de recursos naturais, como a água, por exemplo. Isso levanta a questão da proteção dos civis.

Transition Minett : Qual é o impacto das mudanças climáticas nos fluxos migratórios?

O observatorio de deslocados.as internos.as «IDMC, internal displacement monitoring centre » é um órgão que todos os anos faz um balanço do número de pessoas deslocadas internamente por conflitos armados e/ou mudanças climáticas. Em 2021, havia 32 milhões de pessoas deslocadas em todo o mundo como resultado de desastres relacionados ao clima.

Deve-se observar que os países mais afetados pelos desastres naturais são os países em desenvolvimento ou os países do Sul global e, ao mesmo tempo, são os países menos responsáveis pela desestabilização climática (7 entre 10 dos países mais afetados eram países insulares). Isso levanta a questão crucial da justiça climática e do financiamento dessa justiça.

Transition Minett : E na Europa? Podemos falar de deslocados.as climáticos?

Sim, falamos de « pessoas deslocadas pelo clima » na Europa. Temos os números: em 2021, após as enchentes, havia 16.000 pessoas deslocadas internamente na Alemanha e 16.000 na Bélgica. Em 2022, havia 45.000 na França.
Leia o restante do artigo em nosso blog!

Mais recentemente, houve enchentes na Grécia e no sul da Europa, que também tiveram consequências graves. No médio prazo, os países costeiros também serão afetados pelo aumento do nível do mar.

Transition Minett : O Greenpeace tem alguma iniciativa específica sobre esse assunto?

O Greenpeace Internacional está cada vez mais ativo no campo da justiça climática, apoiando direta ou indiretamente indivíduos ou associações que registram queixas (por exemplo, fornecendo consultoria jurídica ou mobilizando seus especialistas jurídicos). A ação legal é uma forma de influenciar futuras políticas climáticas. Infelizmente, os governos não estão cumprindo com suas responsabilidades e compromissos no âmbito do Acordo de Paris. É por isso que os cidadãos estão tomando medidas legais, porque hoje é a única maneira de fazer com que os governos cumpram seus compromissos.

Temos um exemplo muito bom das Anciãs para a Proteção Climática da Suíça (https://ainees-climat.ch/), que também apresentaram uma queixa à Corte Europeia de Direitos Humanos para responsabilizar o Estado suíço por sua inação climática. As decisões nos dois casos perante a Corte (Portugal e Suíça) serão proferidas em 2024 e terão consequências, pois se a decisão for favorável aos autores, criará um conjunto de jurisprudência que também afetará Luxemburgo.

O Greenpeace está observando de perto esses processos e, no caso de uma decisão positiva, fará o acompanhamento para garantir que os governos mudem suas políticas.

Transition Minett : Você pode nos falar sobre a COP 28 e as questões envolvidas? 

O Greenpeace Internacional estará presente na COP 28 (que acontece de 30 de novembro a 12 de dezembro). Uma das principais questões é como financiar perdas e danos nas áreas que serão mais afetadas pelas mudanças climáticas e nas áreas que se tornarão inabitáveis. Os países responsáveis devem ajudar as pessoas a se estabelecerem em outros lugares. Mas essa é a grande questão: como vamos financiar essas ações?

Em nossa opinião, os países que têm responsabilidades históricas (ou seja, aqueles que emitiram mais CO2) devem contribuir mais. As empresas que mais emitem também devem pagar sua parte justa, tendo em vista que, nos últimos anos, essas empresas tiveram um faturamento recorde: em 2022, por exemplo, a Total lucrou 20 bilhões de euros e a Shell 40 bilhões de dólares, os maiores lucros de suas histórias. O Greenpeace acredita que parte desses lucros deve ser usado para apoiar a resposta à emergência climática, por exemplo, ajudando os deslocados climáticos.

Cada vez mais cidadãos estão tomando medidas legais contra empresas pela poluição que causam e pelas consequências para seus direitos humanos, saúde e meio ambiente. Um número cada vez maior desses casos está sendo bem-sucedido. Em 2022, houve 17 novas ações judiciais contra multinacionais ligadas às mudanças climáticas, movidas por organizações da sociedade civil ou pessoas físicas (casos de poluidor-pagador). Esses casos visam obter perdas e indenizações pelas consequências sofridas e confirmam a importância da questão da justiça climática.


*Deslocado.a climático: uma pessoa que precisa se deslocar dentro de seu país em decorrência de um desastre natural/alteração ambiental ligada à mudança climática. Os refugiados.as do clima se deslocam para fora de seu país pelos mesmos motivos.